Obra a preço de custo. A expressão, que sugere uma opção mais em conta para se construir um imóvel, pode encobrir uma enorme dor de cabeça. Como a que desabou sobre o aposentado Reinaldo Pinto, de 65 anos. Atraído pela “pechincha”, ele comprou, em 2007, um apartamento no condomínio Le Jour, no Recreio dos Bandeirantes, que seria entregue até dezembro de 2010. Ainda hoje, aguarda as chaves:

— Foi o pior negócio da minha vida.

O condomínio foi construído pelo sistema conhecido como obra por administração. Em vez de uma empresa encabeçar o empreendimento — como nas obras por incorporação — os próprios compradores é que assumem a responsabilidade administrativa e financeira pela construção.

— O preço final fica muito mais alto do que o anunciado. Durante a obra, aumentam o valor de tudo — reclama Reinaldo, que decidiu vender o imóvel, antes de recebê-lo.

Cuidado ao contratar

Segundo a especialista em Direito Imobiliário e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Rosângela Gomes, a obra por administração só costuma ser um bom negócio quando todos os compradores são próximos:

— O primeiro cuidado é conhecer os condôminos e ver sua capacidade financeira. Afinal, todos arcam com o prejuízo no caso de inadimplência.

Modalidade pode ser um subterfúgio

O contrato de obra por administração do condomínio Le Jour, no Recreio, é visto como uma espécie de maquiagem pelo coordenador da pós-graduação em Direito Imobiliário da Estácio de Sá, Sérgio Simões. O empreendimento foi lançado em 2006 pela incorporadora Soriedem, do empresário Barão Tozini, que também é dono da Zayd, construtora escolhida para fazer a obra.

A ideia da obra por administração é a de pessoas próximas se unirem para tocar tudo por conta própria. No caso do Le Jour, os condôminos foram atraídos pela Zayd para se juntarem no contrato.

— Na prática, é uma incorporação imobiliária, em que a incorporadora deveria ter responsabilidade por tudo. Mas a empresa usa o contrato por administração como subterfúgio — explica o advogado.

Segundo Sérgio Simões, o procedimento não chega a ser ilegal, mas pode ser questionado na Justiça.

— A empresa chega a indicar a construtora. Isso pode ser questionado judicialmente para desconstruir essa maquiagem e pedir que se torne nulo o contrato, para transformá-lo num contrato por incorporação — ressalta.

Zayd diz que procedimento seria correto

Diretor-presidente da Zayd, Barão Tozini discorda da avaliação de que haja maquiagem nos contratos firmados por sua incorporadora como “obras por administração”.

— Estou baseado na lei. Há um contrato registrado. Eu não faço nada que eu invente ou ache que está correto ou incorreto — afirmou.

Segundo o empresário, a obra por incorporação é aquela que tem um prazo fixo de entrega:

— Nesse modelo de negócio, trabalhamos com preço fechado. As margens de retorno são muito mais altas, mas os riscos também são muito grandes (para a empresa).

As obras por administração atrairiam os compradores por ter custos mais baixos, de acordo com Tozini.

— Às vezes, as pessoas que compram apartamentos por administração têm um lucro de 70%, 80%, porque não existe a figura do incorporador. Na obra por incorporação, a empresa quer ter o lucro, mas arca com o risco da inadimplência — explica.

Nota oficial

Após conceder entrevista ao EXTRA, na sexta-feira, Tozini enviou uma nota, afirmando que, nas obras por incorporação, “apesar de sair um pouco mais cara, o risco é consideravelmente menor, pois, é arcado integralmente pelos incorporadores e construtores. Além do fato de que, em sua maior parte, são financiadas desde o início por instituições financeiras que conferem maior credibilidade ao negócio”.

Fonte: Extra